A mídia como ferramenta de formação de massa crítica a respeito dos impactos da pecuária

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Por: Paulo Maia

No mundo das coisas, a palavra possui uma tônica que você não consegue imprimir no mundo das idéias.
Quando algo tem que acontecer, a palavra do mundo das coisas ganha uma força tão grande que tudo passa a girar em torno daquilo que está para acontecer. O fato. O acontecimento.
Não adianta buscar o mundo das idéias, você não irá conseguir reverter, naquele momento, o que está para acontecer.
Estou abrindo o nosso trabalho aqui dizendo isso porque penso que tento de todas as formas buscar a palavra que se encaixe no mundo das coisas. Fui convidado para falar aqui sobre… “A mídia como ferramenta de formação de massa crítica a respeito dos impactos da pecuária”.
Isso me fez lembrar uma história que a cantora Maria Bethânia conta. Ela diz que um dia recebeu uma música da Adriana Calcanhoto e ficou impressionada diante da beleza de… ” quando vejo seu corpo refletindo o por do sol”. Ligou para a Adriana e disse que iria gravar a música e ela daria nome ao seu disco. Meses depois estava sendo lançado: “Âmbar”.
Como não possuo o talento da Bethânia para sintetizar, muito embora tenha me empenhado muito, mas confesso que não tenho conseguido nenhum avanço, vamos então conversar um pouco sobre… “A mídia como ferramenta de formação de massa crítica a respeito dos impactos da pecuária”.

” A mídia ”

E para começar a nossa saga, vamos tentar entender como ela pode funcionar, ou não, como ferramenta de formação de massa crítica a respeito dos impactos da pecuária.
Para isso, vamos dividir o nosso trabalho em 4 Tópicos:

O início

“A mídia é orquestrada pelos proprietários de suas emissoras e/ou pelos seus patrocinadores”, afirmam, declaradamente, os que contestam a mídia em nosso país. No que eu concordo. “A mídia serve somente ao interesse dos que detêm o seu poder”. Concordo de novo. “A mídia atual serve tão somente como objeto alienador”. Aí eu discordo. Já foi pior. Senão, vejamos:
No início, o jornal em nosso país foi usado como instrumento de um grupo e beneficiava somente a este grupo. Um exemplo disso é que no período da escravidão, os donos de escravos tinham o seu próprio jornal ou patrocinavam quem tinha seu periódico e os abolicionistas que se virassem para possuírem os deles.
Com o advento do rádio – para quem não sabe, tanto este veículo como a televisão são uma concessão que pertence ao governo – a coisa não foi diferente. Em seu início, chegou a servir por anos a fio somente ao estado brasileiro.
Com o implemento da televisão, a mesma ladainha se repete. Ela servia de veículo para o grupo a que pertencia e seus programas eram patrocinados abertamente por empresários que queriam fazer parte deste grupo. Um exemplo curioso é que os programas eram patrocinados por marcas de bancos e empresas. Você sabia, por exemplo, que quando a Rede Globo lançou o Jornal Nacional suas transmissões se resumiam ao Rio, a São Paulo e a outros míseros locais. Então, como que um programa de jornal poderia ter esse nome? Resposta fácil para a época. Pelo simples fato de que era patrocinado pelo Banco Nacional, da família do político mineiro Magalhães Pinto.
Hoje, o mesmo acontece, só que de forma escamoteada. Grupos de famílias detêm jornais e emissoras de rádio e televisão e vendem esses veículos, através da publicidade, em suas maiores parcelas para grupos de famílias que são donos de bancos, empresas e fábricas. Isso acontece mesmo recebendo incentivo do governo. Na América Latina, a televisão é o maior veículo de informação. Em nosso país, o Jornal Nacional, da Rede Globo é o meio de informação de 90% dos brasileiros.
Enquanto a televisão é essa coca cola toda na América Latina, a internet caminha a passos largos em países desenvolvidos e a passos lentos nos subdesenvolvidos. No Brasil, ainda não há representatividade de informação para a internet por inúmeros motivos e o maior deles é a falta de credibilidade do veículo. Os sites de notícias possuem visitação segmentada e pequena e os de notícias sobre o meio ambiente e defesa animal idem, comparados aos números da televisão.
Dito isto, passamos ao nosso segundo tópico:
A importância da mídia no Brasil. Seria ela o quarto poder? Temos então o Legislativo, o Executivo, o Judiciário e o mais poderoso de todos: O STFI (Superior Tribunal Federal da Informação).
Vejamos. Muitas das vezes, causas que são fáceis de imaginar o seu fim ou pelo menos de que forma será travada a peleja, elas sequer existem pelo simples fato de que a opinião pública terá acesso à informação do que aconteceu e poderá se rebelar com o resultado.
Um exemplo recente é o caso da ex-ministra e atual senadora e pré-candidata à presidência de nosso país, Marina Silva. É prerrogativa da discussão partidária que o mandato político não é do candidato e sim do partido. Marina Silva é uma das fundadoras do Partido dos Trabalhadores e se elegeu senadora por ele. Logo, ao sair do partido deveria entregar o cargo. Não o fez e o PT sequer questionou. O Partido dos Trabalhadores fez isso pelo simples fato de que percebeu que toda a opinião pública seria informada pela mídia da peleja no tribunal e o desgaste político do presidente da nação seria estratosférico, pelo simples fato de que poderia soar como perseguição a senadora.
Em suma, foi o STFI que, mesmo sem se pronunciar, resolveu a questão. Como este, existem inúmeros casos em que a opinião pública, informada pelo STFI, é capaz de mudar os seus andamentos ou sequer permitir que eles tenham início. Para não deixar isolado o caso da pré-candidata à Presidência da República Marina Silva, temos no mesmo balaio o senador sulista da família Arns que era do PT, na mesma época e pelo mesmo motivo que o de Marina Silva, abandonou o PT e foi para o PSDB e nada aconteceu.
Então chegamos agora ao nosso maior e mais esperado tópico que é o…
Os grandes patrocinadores aliados à falta de conhecimento versus as perspectivas para que a mídia seja uma formadora de opinião.
Defender a causa animal e ambiental é uma árdua tarefa já que se contrapõe a interesses sempre de cunho financeiro.
Quem quer destruir uma floresta não o faz por outro motivo senão o lucro financeiro. Quem constrói uma ‘fabrica’ de animais não o faz por outro motivo se não o já citado.
“As aves e as outras espécies que são criadas em confinamentos nas fábricas não são as mesmas que são criadas em casas, sítios ou fazendas. Não podemos imaginar que uma galinha que seja criada no quintal e tem nome afetivo como Giselda, Margarida e etc terá o mesmo fim de aves que estão sendo ‘fabricadas’ em larga escala para consumo humano”. Essa afirmativa foi proferida por um conceituado filósofo brasileiro, em um seminário no Rio de Janeiro do qual eu participava e contestei afirmando que esse pensamento segue a linha de raciocínio dos europeus que, como noticiam amplamente os jornais e foi abertamente citado no premiado filme Central do Brasil, ‘compram e extraditam’ crianças brasileiras pobres para que em seus paises doem involuntariamente seus órgãos infantis para crianças de origem nobre.
Deve ser ainda seguindo este desastroso raciocínio que as indústrias vêem os animais, como a igreja católica há bem pouco tempo via os negros e os índios, ou seja, sem alma. São seres que não têm desejos e, consequentemente, não possuem sentimentos, portanto, não sentem dor, frio ou medo.
Na contra partida a este inacreditável pensamento que fortemente nos afronta, existe o poderio da mídia fortalecido pela desinformação e/ou desinteresse de quem ainda equivocadamente vê o animal como seu alimento ou como seu enfeite predileto.
A desinformação em grande escala pode ser por total falta de conhecimento ou, ironicamente, pelo total conhecimento da informação.
Pelo total conhecimento da informação temos como caso a recente e acintosa troca do nome de uma peste como a gripe suína para gripe H1N1. Trocar o nome da marca de um automóvel por causa das quedas nas vendas não muda o curso da queda das vendas. Trocar o nome de uma doença que irá provocar uma eminente epidemia não muda o curso da epidemia. O que muda este curso é o alerta de que algo está fora de controle e a conscientização de que insistir na ‘construção de fábrica’ de animais é um erro de percurso que a humanidade tem pago com a própria vida.
A todo momento temos pestes e consequentemente mortes que poderiam ser evitadas se não houvesse a ganância empresarial que cega os endinheirados homens do poder, fazendo com que eles não enxerguem animais como seres vivos, com ou sem alma, mas que merecem o respeito e a dignidade humana.
Estes homens não só não enxergam isso como manipulam animais como se fossem objetos, dando-lhes, além dos maus tratos sofridos nos confinamentos e as mortes violentas, ingredientes que, manipulados em seus alimentos, causam grandes distúrbios. Mas esta manipulação pode ser justificada quando se pensa na enorme demanda que alimenta a compra e venda dos corpos e derivados destes animais.
E é justamente em nome desta demanda que enfermidades têm abatido a humanidade, seja com o gado e a sua vaca louca, seja com o frango e a sua gripe aviária e agora com os porcos com a gripe suína.
Em suma, o que está sendo exposto aqui não deve ser considerado novidade para o grupo de pessoas que atuam na defesa da causa animal mas, com certeza, é uma informação imprescindível para a humanidade que infelizmente não terá acesso a esta informação pelo simples fato de que há um massacre financeiro junto a grande mídia para que não se toque, não se mostre, não se dissemine informações deste cunho.
Fortalecendo este ‘silêncio pago’, a mídia ainda atrapalha mais quando não informa corretamente. As informações truncadas ou equivocadas são frutos de uma sociedade consumista e nós jornalistas não estamos imunes a isto. Em nossa categoria também existe o embate dos que são carnívoros e dos que são vegetarianos. O problema é que o primeiro grupo é enormemente superior em número do que o segundo. Seja de forma voluntária ou imposta, fortalece, ainda que por tabela, o especismo.
Na COP XV, na Dinamarca, em Dezembro de 2009, onde a delegação brasileira teve pífia participação, não se comprometendo com nada, com nenhuma meta e que ainda teve a constrangedora declaração da presidenciável Dilma Roussef ao afirmar que ” o meio ambiente é, sem dúvida nenhuma, uma ameaça ao desenvolvimento sustentável!”, o encontro foi palco de acirrada discussão sobre o meio ambiente.
Nesta discussão, uma das maiores preocupações do mundo é com a floresta amazônica e como ela está sendo vista e tratada. O desmatamento amazônico beira o absurdo mas nada que se compare à forma com que os americanos vêem a nossa floresta. Veja abaixo como o respeitado Museu de História Natural de Nova York divulgou nos EUA como é a nossa Amazônia.
Voltando ao especismo, ele em muito atrapalha a mídia na divulgação de matéria sobre os animais. O jornalista especista tende de forma natural a pautar o animal de sua predileção para a matéria de capa e ao fazer isso aniquila com as outras espécies. Uma matéria sobre os peixes não pode conter somente baleias, tubarões e golfinhos. O tema deve ser aprofundado para que, enriquecido, mostre as outras espécies do mar.
Talvez seja por isso que, a todo momento, temos colegas publicando nomes de animais de forma equivocada, quando não, atribuindo créditos a espécies anatomicamente diferentes. Vejam a seguir como o editor do Caderno Opinião, do jornal O Globo, acredita ser uma garça ou um grupo delas.
Não fosse o fato de o biguá ser bem menor e de cor negra…
Como falamos aqui dos grandes patrocinadores das fábricas de animais de uma forma bem tranqüila, polida e elegante, esperamos assim não ser acionados judicialmente, o que vale também para a desinformação de alguns colegas, passamos ao crucial tema das perspectivas para que a mídia seja uma formadora de opinião.
Diante do que foi exposto aqui só temos a confirmar que são ruins as perspectivas de que a mídia atue como um grande instrumento formador de opinião. Se no campo da defesa ambiental já tivemos progresso, no campo da defesa animal tivemos pouca coisa ou quase nada.
Vou fazer aqui uma afirmativa extremamente polêmica. Não necessitamos do animal enquanto alimento para o ser humano. Mas como fazer esta polêmica informação chegar à população com a grande mídia sucumbindo ao massacre financeiro imposto pelos proprietários das fábricas de animais? Isto porque esta imposição está intrinsecamente ligada ao patrocínio.
Quando uma fábrica que vende cadáveres de animais tem algum deslize maior e se vê na mídia, imediatamente isto é ‘abafado’ com o álibi de que se trata de uma situação atípica. E o resultado disso é que os grandes telejornais não comentam a matéria ou fazem de forma rápida para que não fique caracterizado como isenção jornalística.
E também não há interesse da mídia em propagar de forma espontânea este assunto já que ela em sua grande maioria é consumidora direta do produto. O jornalista que sente prazer no consumo da carne, e não tão somente busca o seu pseudo nutriente, dificilmente se comoverá com a dor e a angústia dos animais e certamente não irá lutar para que seja aprovada uma pauta sobre o sofrimento animal. Como nos primórdios dos jornais brasileiros, os senhores de engenho também não permitiam que se tocassem no assunto da dor e da angústia que fugiam das senzalas.
PAULO MAIA É JORNALISTA, AMBIENTALISTA, DIRETOR PRESIDENTE DA ONG SOS AVES E CIA.

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